domingo, 10 de março de 2013

Cardeais buscam um Papa com carisma e que seja durão

Algumas pistas das características procuradas em um futuro pontífice podem ser deduzidas a partir de declarações dos cardeais que passaram a última semana em reuniões no Vaticano. Antes de quarta-feira, quando eles pararam de dar entrevistas, os sacerdotes frequentemente citaram alguns atributos que a Igreja precisa neste momento: um exímio comunicador que consiga conquistar almas através de suas palavras e que tenha um comportamento santo. E também um xerife destemido, para conseguir lidar com as desordens e escândalos no Vaticano.
O foco que eles deram para a comunicação e bom governo é, em muitos aspectos, um reconhecimento das deficiências do Papa Bento XVI, que voou de helicóptero para uma aposentadoria inesperada, depois de um mandato pedregoso de oito anos. Mas é também um símbolo de nostalgia em relação a seu antecessor de Bento XVI, João Paulo II, uma presença magnética que comandou, entre holofotes, viagens ao redor do mundo mesmo quando estava no fim da vida.
Sob olhares do Papa Bento XVI, a Igreja perdeu influência na Europa, nos Estados Unidos e até mesmo na América Latina. A burocracia central em Roma, na Cúria, caiu profundamente em disfunção e até mesmo corrupção. Cardeais de diversos países comentaram esta semana que estavam seriamente preocupados com os recentes relatos na mídia italiana sobre um dossiê secreto que teria sido dado à Bento XVI, e conteria explosivas evidências de chantagem sexual e financeira. O dossiê confidencial deve ser mostrado ao próximo Papa.
Poucos candidatos vêm com todo o arsenal de talentos, e os meios de comunicação italianos chegaram a cogitar a ideia de que os cardeais estão considerando combinar um papa pastoral com um Secretário de Estado duro e experiente, que poderia atuar como administrador e, se necessário, executor.
O próximo papa talvez não precise fazer uma ofensiva contra as rivalidades e crimes no Vaticano, mas deve ter pelo menos a inteligência de nomear um vice destemido o suficiente para enfrentar a entrincheirada burocracia do Vaticano.
- A primeira coisa que ele tem que fazer é colocar mais ordem na administração central da Cúria - disse o cardeal Edward Egan, arcebispo emérito de Nova York - Ele tem que estar disposto a aceitar críticas, e ao mesmo tempo precisa ser um homem que entenda a fé e possa anunciá-la de uma maneira descomplicada e atrativa - completou Egan, cardeal que votou no conclave que elegeu Bento XVI, mas agora não poderá votar por exceder a idade limite de 80 anos.
Para aqueles cujos nomes circularam como "papáveis", os discursos feitos até agora servem em parte como testes.
- O atraso na programação do conclave indicou que os cardeais ainda estavam em uma fase de avaliação de personalidades, registros e ideias de cada um - disse Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano, em uma coletiva de imprensa na última quinta-feira.
Qualquer candidato sério deve estar sempre em oração, ter uma boa base teológica e ser fluente em italiano, a língua do Vaticano e de Roma, que é, afinal, diocese do Papa. Vários cardeais também disseram que o próximo Pontífice deve ter tido experiência como bispo de uma diocese. Essa descrição poderia excluir alguns candidatos que serviram a maioria de seus anos na Cúria, e aqueles com pouca experiência pastoral , como o cardeal Gianfranco Ravasi, o erudito italiano a quem Bento XVI deu a honra de pregar no recente retiro quaresmal do Vaticano.
O cardeal Donald Wuerl, arcebispo de Washington, disse em uma entrevista:
- Acho que ser um pastor de uma igreja local seria um fator muito importante se você vai estar envolvido espiritualmente nessa ideia de renovação da Igreja.
Alguns cardeais também enfatizaram que o Papa deve ser capaz de atingir a outras religiões, melhorar as relações com os bispos de todo o mundo e apresentar vigorosamente a doutrina católica. Muitos daqueles mencionados como papáveis foram apontados como grandes administradores, seja em suas arquidioceses, na Cúria Romana, ou em ambos. Isso inclui os cardeais Angelo Scola, arcebispo de Milão; Odilo Pedro Scherer, arcebispo de São Paulo; Peter Erdo, arcebispo de Esztergom-Budapest e primaz da Hungría; Leonardo Sandri, um argentino com longa experiência na Cúria; e Marc Ouellet, um canadense que dirige a poderosa Congregação dos Bispos do Vaticano.
Mas alguns desses bispos são conhecidos por terem pouca presença ou carisma. Os cardeais Erdo e Ouellet são famosos por ficarem mais confortáveis lendo um texto previamente preparado do que falando espontaneamente diante de multidões ou em entrevistas, de acordo com associados e ex-alunos.
Outros cardeais, por sua vez, viram suas reputações melhorarem com uma capacidade comprovada de se comunicar com o público de massa, como notavelmente faz o cardeal Luis Antonio Tagle, das Filipinas. Mas sua idade, apenas 55 anos, depõe contra ele. Tagle é o segundo mais novo cardeal, atrás apenas de Baselios Thottunkal, da Índia.
- É necessário mais tempo para construir sobre os alicerces. Eu acho que nós precisamos de um papado mais longo para gerar energia e manter o dinamismo - afirmou Napier. - A partir de conversas informais, alguns dos outros cardeais também estariam olhando nessa direção - completou.
No passado, seria impensável ter um sério candidato papal dos Estados Unidos, uma superpotência econômica e política, mas os observadores do Vaticano dizem que, pela primeira vez, há entusiasmo para dois americanos que têm tanto carisma quanto força administrativa: Timothy Dolan, de Nova York, uma presença falante, e Sean Patrick O'Malley, de Boston, um frade franciscano.
Ainda é pouco provável que qualquer um deles se torne Papa, em grande parte porque os Estados Unidos ainda são vistos como uma superpotência global cujos interesses nem sempre se encaixam tão bem com os da Igreja Católica, mas este conclave é o primeiro a quebrar o tabu.
- Pela primeira vez os americanos estão sendo considerados. Isso é novidade - disse Marco Politi, um veterano vaticanista na Itália.
Fonte:Agência O Globo